Aprenda a calcular o Unit Economics de sua Startup
Como a análise precisa do CAC e LTV pode ajudar a mensurar a viabilidade econômica da sua startup
Sua startup está tendo resultados negativos. Será que isso é reflexo de um modelo de negócio economicamente inviável, ou só precisa do investimento correto para ganhar escala/eficiência e alcançar números sustentáveis? Sabemos que essa dúvida tira o sono de muitos empreendedores, portanto, neste artigo, queremos ajudá-los a entender métricas importantes para avaliar seu modelo de negócio.
Unit Economics para Startups
Analisar seu Unit Economics consiste em expressar a receita e os custos do seu modelo de negócios em uma base unitária (por exemplo, um restaurante teria como base unitária cada refeição que produz e comercializa). Compreendê-lo te ajudará a responder a pergunta do parágrafo anterior e potencialmente pode mostrar aos investidores que faz sentido investir no seu modelo, porque após atingir escala e eficiência, ele vai parar de pé.
Em tese, qualquer empresa pode realizar uma análise de Unit Economics, mas no ambiente de Startups, é muito comum associarmos isso a duas métricas principais: LTV e CAC. Vamos abordar esses dois conceitos abaixo, mas antes precisamos garantir que você possui clareza em relação a:
Churn rate
Representa a taxa de desistência, ou seja, quantos clientes deixam a empresa após um intervalo de tempo (mês, ano, trimestre etc). Por exemplo, uma empresa SaaS que fecha 100 contratos no começo do ano, e ao final do mesmo apenas 80 renovam, teria um churn rate anual de 20%.
Depreciação
É a perda de valor de um bem por seu uso e desgaste ao longo do seu tempo útil. Inclui-se a depreciação como uma despesa (ou custo) contábil e o jeito mais comum e prático de calculá-la é através da depreciação linear. Por exemplo, suponha que você adquiriu um veículo por R$100.000 (Valor do Ativo) e sabe-se que o preço médio de um seminovo do mesmo modelo, com 5 anos, é de R$70.000 (Valor Residual). Nesse caso o seu Valor Depreciável será de R$30.000, para ser depreciado em 5 anos, ou seja, uma depreciação anual de R$6.000.
Margem de Contribuição
Nada mais é do que a receita unitária de um produto/serviço menos os seus custos e despesas variáveis. Exatamente por excluir os custos e despesas variáveis, o valor que ‘sobra’ contribui com o pagamento dos custos e despesas fixos da operação.
Por exemplo, suponha que uma Startup compra vestidos para depois alugá-los, lembrando que o unit economics é relacionado ao produto ou serviço da empresa, no caso o aluguel, não o vestido em si. Nesse caso, a receita é o valor pago por aluguel, enquanto que os custos e as despesas variáveis, dentre outros, seriam: embalagem; logística da entrega e devolução; processamento do pagamento; limpeza do vestido.
Taxa de Desconto
É usada para trazer a valor presente algum valor futuro. Essa taxa é muito utilizada no mercado financeiro como um todo, sendo uma tentativa de mensurar os riscos de um investimento (quanto maior o risco da empresa, maior a taxa de desconto aplicada a seu valor). Sabemos que o dinheiro perde valor ao longo dos anos e que conseguimos comprar mais coisas com R$100 hoje do que com os mesmos R$100 daqui 10 anos.
Tempo de Vida do Cliente
É o tempo que a empresa consegue reter o seu cliente, ou seja, em média quanto tempo o cliente consome o produto/serviço da empresa. Por exemplo, suponha uma plataforma de streaming de música que começou o ano com 100 clientes, e dentre eles, 25 cancelaram após 6 meses de uso, 50 cancelaram após 9 meses de uso, e 25 cancelaram após 12 meses de uso. Sendo assim, o tempo de vida equivale a:
CAC (Customer Acquisition Cost)
O CAC está relacionado ao custo de aquisição do cliente, ou seja, o quanto que eu preciso gastar para convencer alguém (ou uma empresa) a consumir meu produto/serviço. O valor gasto com aquisições de clientes, geralmente, se resume a despesas como Vendas, Pesquisas de Mercado e Marketing, sendo alguns exemplos os salários do time de vendas e marketing, impulsionamento em redes sociais, eventos, influencers, e descontos. Dimensionar o que deve entrar no cálculo do CAC nem sempre é tão simples, e é extremamente importante ser rigoroso e incluir tudo o que de fato é gasto na aquisição do cliente, para evitar subestimar tais despesas e ter uma visão equivocada do real custo de aquisição.
Ao final do artigo vamos voltar a falar sobre o CAC e algumas sugestões do que se fazer, mas por ora vamos compreender como calculá-lo. O primeiro passo é determinar o período a ser analisado, por exemplo, o último trimestre da empresa. Após isso, basta calcular todas as despesas, que citamos acima, e dividir pelo total de novos clientes adquiridos nesse período.
Suponha que a empresa acabou de lançar o seu e-commerce e está fazendo um marketing via ads, e deve pagar R$0.50 para cada clique. O impulsionamento leva 1.000 leads (potenciais clientes) para a plataforma, que irá gerar 100 usuários cadastrados e apenas 20 clientes de fato consumindo o produto/serviço. O CAC não será referente aos 20 clientes convertidos, ou seja, R$0.50 (R$10 no total) porque você deve considerar no cálculo do seu CAC tudo o que foi gasto na tentativa de conseguir o cliente, independente se sua conversão veio a se concretizar ou não.
Fica claro que, na situação acima, o CAC é muito maior do que os R$0.50, já que, na prática, a empresa gasta R$25 para adquirir um único cliente. Outra maneira de se chegar ao mesmo valor, seria utilizando o Custo por Lead e a probabilidade desse lead ser convertido em um cliente de fato, ou seja, a taxa de conversão. No nosso exemplo acima, vimos que dos 1.000 leads, apenas 20 foram convertidos, ou seja, apenas 2% da nossa base inicial.
LTV (Lifetime Value)
O LTV (Lifetime Value) é o valor do tempo de vida de um cliente, ou seja, o valor que, em média, um único cliente irá trazer para a Startup em toda a sua vida útil. Muitos devem estar pensando “Ah, isso é fácil, é só multiplicar a receita média de um cliente pelo seu tempo médio de vida (considerando o churn)”. De fato, esse é um jeito possível e muito utilizado para calcular o LTV, mas não é o único e, provavelmente, não é o mais adequado. A receita não traduz a margem de fato gerada por cada cliente e, portanto, muitos optam por calcular o LTV com base na margem de contribuição Não há consenso de qual é o melhor jeito, logo o objetivo é sempre buscar o valor que seja mais justo e alinhado com o seu modelo de negócios. No final do artigo damos nossa opinião quanto a isso, então não desista até lá :)
i) LTV — Receita
Provavelmente, é o jeito mais conhecido, e consiste em tentar estimar a receita média gerada por um único cliente em um período fechado de tempo e multiplicar pelo tempo médio que fica como cliente da Startup. Por exemplo, uma receita média de R$100/ano e um tempo médio de vida do cliente de 10 anos resultaria em um LTV de:
Em relação ao tempo de vida médio do cliente, ele não precisa ser necessariamente em anos. Use o intervalo de tempo que fizer mais sentido para o seu modelo (ano, trimestre, mês etc), e explicamos como se calcular acima, no tópico Unit Economics para Startups, e mais para frente vamos explicar, também, como utilizar o churn para o cálculo do tempo de vida.
Em relação à receita média por cliente, ela vai depender muito do seu modelo de negócios. Por exemplo, se a sua Startup é um marketplace*, uma alternativa seria multiplicar o valor do ticket médio de cada transação pelo número de transações médias que a pessoa realiza no intervalo de tempo selecionado; ou se a sua Startup opera em um modelo de assinatura, como as empresas SaaS**, basta multiplicar o valor da assinatura pelo intervalo de tempo escolhido.
* Ticket médio por transação x Número médio de transações por cliente/ano = Receita média anual
** Mensalidade média x Duração do contrato de 12 meses =Receita média anual
ii) LTV — Margem de Contribuição
O racional do cálculo do LTV é o mesmo, a única diferença é que, ao invés da Receita, vamos utilizar a Margem de Contribuição. A principal justificativa para isso é que ao utilizar a receita, você corre o risco de superestimar o valor gerado por cada cliente, e acabar gastando muito mais do que poderia com a aquisição do mesmo (CAC insustentável). Por exemplo, suponha que o seu CAC é de R$100 e que o seu cliente em média irá comprar o seu produto 3 vezes, no valor de R$50, o que representaria um LTV de R$150. Se a sua margem de contribuição for de apenas 50%, esses R$150 representam um resultado positivo de apenas R$75, ou seja, o sua cliente não paga nem o custo de aquisição dela.
LTV= 3 x R$50 = R$150 → Margem de contribuição de 50% → Resultado positivo = R$75
CAC = R$100 > Resultado Positivo = R$75 → CAC Insustentável
Lembrem-se que o CAC não deve ser incluído como custo/ despesa variável no cálculo da margem de contribuição; o CAC é apenas o custo para adquirir o seu cliente. Uma situação como a acima indica que a sua estratégia para adquirir clientes, ou o modelo de negócio como um todo, precisa ser repensado e aperfeiçoado. Caso contrário, a solução nunca irá parar de pé.
iii) LTV — Depreciação e Taxa de Desconto
Antes de falar do último método, que seria a maneira mais rigorosa e cautelosa para calcular o seu LTV, vamos entender como chegar no LTV usando apenas o churn rate ao invés do tempo de vida do cliente.
Suponha que a Margem de Contribuição média de um cliente seja R$100 e que o churn rate anual da empresa seja de 20%, ou seja, todo ano, 20% dos clientes param de pagar pelos serviços/produtos da empresa. Ao invés, de pensar em 20% dos clientes, pense em 20% da receita (ou margem de contribuição) sendo perdida todo ano, claro que nem todos os clientes são iguais, mas dado que estamos trabalhando com a média deles, não fará diferença. Pensar em perda de receita facilita entender o raciocínio abaixo, que é o de projetar ano a ano a margem de contribuição como a margem do ano anterior menos a quantidade que foi perdida (a quantidade que virou churn).
Fizemos até o ano 30, mas a soma de todos esses anos tende a um LTV de R$500, que seria o equivalente a dizer que o cliente tem um tempo de vida médio de 5 anos.
Não há necessidade de utilizar o excel para estimar cada ano e ver para qual número a soma de todos os anos, ou seja, nosso LTV, converge. A situação que temos, em que o churn é constante todos os anos, nos leva a soma de uma progressão geométrica decrescente, que em resumo pode ser resolvido utilizando a seguinte fórmula:
Como dito anteriormente, esse é um método mais rigoroso para calcular o seu LTV, já que acrescentar variáveis como Depreciação e Taxa de Desconto irá diminuí-lo consideravelmente. É extremamente difícil ver empresas aplicando esse método no dia a dia, o qual acaba sendo usado, principalmente, com um teor mais acadêmico. De qualquer maneira, esses são conceitos importantes que devem ser entendidos, e se não tiverem utilidade aqui no cálculo do LTV, certamente terão durante a evolução da sua empresa.
Como a depreciação afeta o Unit Economics
Vamos voltar ao exemplo usado para explicar a margem de contribuição, o da plataforma que compra vestidos para depois alugá-los. Anteriormente, fizemos a conta normalmente da margem de contribuição, sendo receita menos custos e despesas variáveis, o que compreendia basicamente: embalagem; logística da entrega e evolução; processamento do pagamento; limpeza do vestido. Um ponto que não levamos em conta aqui é o de que, o mesmo vestido não pode ser utilizado para sempre, ele tem a sua própria vida útil.
Isso tem que ser levado em conta, pois suponha que o custo para adquirir o vestido é de R$100 e você irá conseguir alugar ele por R$20 e que sua vida útil é de 10 usos. A princípio parece um cenário interessante, gasto R$100 para obter R$200. Entretanto, adquirir o vestido é apenas um dos custos, ainda tenho diversas despesas e custos, variáveis e fixas. Vamos supor que após contabilizar tudo isso, chegamos a um lucro de R$100 por vestido, um valor insustentável, pois terei que gastar todo o meu lucro comprando o próximo vestido. Análogo à discussão de usar a margem de contribuição ao invés da receita, ao ignorar o efeito da depreciação, você talvez esteja superestimando a lucratividade do seu modelo de negócios ao não levar em conta o custo para repor o inventário.
Claro que, conforme a Startup ganhe escala, ela consegue ir diluindo os custos e despesas fixas e talvez a operação seja viável sem mudar muito o modelo de negócios. Esse exemplo serve só para levantar o ponto de que se o seu modelo for altamente dependente de algum ativo, provavelmente será importante (no mínimo interessante) considerar a depreciação na conta da sua margem de contribuição.
Por fim, é válido levar em conta a utilização de uma taxa de desconto para as suas projeções de receita (ou margem de contribuição) para os anos seguintes, trazendo tais valores a valor presente. Como falamos anteriormente, a taxa de desconto sempre é levada em conta quando temos projeções e precisamos mensurar os riscos e incertezas das operações, principalmente se tratando de uma Startup. Como exemplificação abaixo, usamos uma taxa de desconto de 20%:
Assim como no exemplo anterior não havia a necessidade de projetar no excel, aqui também não há Podemos utilizar uma fórmula que funciona sempre que tivermos uma taxa de desconto e um churn constantes:
Dúvidas e Provocações
Se você aguentou chegar até aqui, parabéns e muito obrigado :). Apesar de longo, certamente não conseguimos cobrir tudo e, provavelmente, ao longo da leitura você ficou “Ok, mas por que eu faria isso?”. Então, aqui tem algumas respostas (provocações) para algumas possíveis dúvidas:
Devo ter apenas um único cálculo de LTV e/ou CAC?
Provavelmente, você terá um cálculo geral de LTV e um de CAC que representam a sua empresa como um todo. Entretanto, é muito interessante ter uma segmentação entre os seus diferentes clientes e estratégia de aquisição. Por exemplo, suponha uma Startup que oferece algum tipo de benefício corporativo para diversos perfis de empresa, de micro até uma enterprise. Certamente, o LTV de uma enterprise será muito maior do que o de uma empresa menor, bem como o seu CAC. Ter uma segmentação do LTV/CAC por tipo de cliente pode dar insights interessantes que vão ajudar na decisão de qual perfil de cliente devem focar. Uma conclusão possível é de que o alto LTV gerado por uma enterprise não se justifique dado o exaustivo e custoso processo para fechar o contrato.
Outra aplicação seria para estudar qual é a melhor estratégia de vendas/marketing, ou seja, uma análise do CAC. Por exemplo, suponha uma Startup que venda em seu e-commerce produtos de beleza masculinos, e que ainda não sabe qual é o melhor jeito de atingir o seu público alvo. Ela decide fazer divulgação normal via ads e via influencers durante 3 meses. Após esses 3 meses é super valioso saber como se comportou o CAC dessas duas estratégias, qual é mais eficiente em levar leads para o e-commerce e quais têm mais chances de converter em clientes consumidores. Uma conclusão possível é de que os influencers possuem uma escala muito menor, gerando menos leads, mas em compensação falam diretamente com o público alvo e, portanto, possuem uma taxa de conversão maior.
Meu LTV/CAC é elevado significa que está tudo perfeito?
Antes de chegar nessa conclusão, tenha certeza de que você foi rigorosa no cálculo de ambos indicadores, LTV e CAC, e que o valor reflete bem a realidade do seu modelo de negócios e de seus clientes. Quando tiver certeza quanto a isso, compare o seu LTV/CAC com seus benchmarkings e competidores. Um LTV/CAC de 5x pode ser tanto ruim quanto bom, tudo vai depender de como você se compara com os demais players do setor.
Mais importante do que o seu LTV e CAC atual, é como vem sendo a sua evolução. Ao analisar os dois valores separadamente, é possível entender se ao longo do tempo a empresa está sendo mais eficiente na aquisição do cliente, e se estão conseguindo aumentar a retenção e o ticket médio gasto por eles. Além disso, volume é importante também. Talvez ter a maior eficiência possível não compense uma base de clientes muito pequena no médio/longo prazo. Reforço que não estamos falando que a melhor solução é aumentar os gastos de maneira irresponsável, apenas para serem céticos e críticos em relação a tudo, inclusive com os bons resultados, não se acomodem!
Na prática, o mais importante é entender que estamos falando de métricas da sua empresa. Você não deve calculá-lo apenas um mês antes de ir captar uma rodada. Acompanhar a evolução desses e outros indicadores vão ajudar na tomada de decisão do dia a dia. Claro que faz parte da negociação e do processo de investimento convencer o investidor de que essa é a tese certa, e é o trabalho dele fazer a diligência e chegar nas suas próprias conclusões. Apenas tenha certeza de que está sendo o mais honesto consigo mesmo, afinal o maior crítico da sua tese deve ser você próprio.
Nos vemos no próximo artigo. Se tiverem sugestões de temas que gostariam de aprender ou dúvidas sobre esse conteúdo acima, fiquem à vontade de nos mandar no contact@maya.capital.
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